O agronegócio, pilar economia brasileira, enfrenta um desafio cada vez mais presente: as mudanças climáticas. Secas, inundações e outros eventos extremos impactam a produção, gerando perdas financeiras significativas. É nesse cenário que os derivativos climáticos surgem como uma ferramenta capaz de mensurar e precificar a volatilidade climática direta, viabilizando a mitigação de riscos.
Entendendo Derivativos
Os derivativos são produtos de investimentos, que derivam de outros ativos, sejam eles físicos como o café e soja ou financeiros, como por exemplo o dólar, índices e ações. Nesse sentido, o valor final de uma operação com esse produtos vai derivar do valor do produto original.
Sua negociação é realizada através de contratos, divergindo na maneira de precificação do ativo, podendo ser a termo, futuros, de opções e swaps. No mercado a termo, o valor do ativo é estabelecido ao momento em que o contrato de compra e venda foi firmado, sendo liquidado ao momento e preço firmado. Nos contratos futuros, também é firmado uma data e um valor definido, entretanto a forma de liquidação varia de acordo com o ajuste diário do ativo negociado, devendo a diferença de precificação ser paga ou recebida pelo detentor do contrato. O contrato de opções, confere ao investidor opção de venda ou de compra de um determinado ativo dentro de um tempo estabelecido no contrato. Já os contratos de swaps, conferem aos signatários do contrato a troca de rentabilidade entre dois ativos.
Verifica-se que a função econômica principal dos derivativos consiste em garantir proteção contra o risco especulativo do ativo-objeto, permitindo a fixação do preço de compra e de venda do bem em questão em uma operação que será liquidada no futuro (hedge). Pela sua negociação crescente, novos instrumentos têm sido desenvolvidos para suprir as necessidades específicas de agentes em posições cada vez mais dinâmicas, sendo esses instrumentos moldados para a melhor mitigação de riscos de preço, crédito e de clima, e é nessa esteira que surge a figura do derivativo climático.
Surgimento de Derivativos Climáticos
Inicialmente utilizado no setor de energia, o derivativo climático surge como ferramenta para mitigar o risco de variabilidade de consumo de energia elétrica em decorrência de climas mais quentes ou mais amemos. Na sequência, surgem outros derivativos climáticos pautados em índices meteorológicos associados aos níveis de chuva, neve, vento, entre outros. Ou seja, verifica-se que o valor desses papéis varia conforme a ocorrência de eventos climáticos, como flutuações de temperatura, volume de chuvas e quantidade de neve, geadas e granizo.
Nesse sentido, o contrato de derivativo climático apresenta algumas características: periodicidade (data de início e de encerramento da operação), estação de medida, variável climática (consoante ao período do contrato), índice (variável climática que o contrato busca acompanhar), função de payoff e, em alguns dos casos, prêmio (pago pelo contratante no início da operação).
Contratos a termo e futuros climáticos
Os contratos a termo e futuros climáticos podem apresentar duas estruturas principais de payoff, com ou sem limite financeiro. Com base na ótica de um agente com a posição comprada (long), o resultado desses derivativos, na modalidade sem limitação financeira, pode ser expresso pela equação 1:
PO(x) = D(x-K) (Equação 1)
Onde PO representa o payoff do contrato, D é o valor monetário estabelecido para cada unidade do índice climático (seu ativo-objeto), x é o valor do índice para o período do contrato, e K é o strike da operação. No caso de uma opção climática, o strike refere-se a um limiar delimitado abaixo (ou acima) da condição climática especificada no contrato (por exemplo, temperatura e pluviosidade), em que a indenização é (ou não) acionada. Por exemplo, em um contrato de pluviosidade, o strike poderia ser definido com base numa determinada quantidade mínima (ou máxima) de precipitação predeterminada.
Ao considerar uma limitação financeira, o contrato inclui limites máximo e mínimo aos resultados monetários, de acordo com barreiras previamente fixadas para o índice ativo-objeto do contrato. Isto é, definem-se limites máximos para os ganhos ou perdas na aplicação da equação 1.
Em geral, nenhum dos procedimentos implica em despesas para o agente durante a contratação, o que significa que não há pagamento de prêmio no início do acordo, embora geralmente seja necessário fazer um depósito como margem de garantia. Além disso, é importante observar que transações feitas em um ambiente de balcão geralmente só são liquidadas no término do contrato. Por outro lado, os contratos realizados em uma bolsa têm ajustes diários nas posições.
A título de exemplo, no caso de um produtor que queira se proteger de temperaturas altas que possam afetar sua produção agrícola, podem ser firmados contratos baseados em índices climáticos calculados sobre a variação média da temperatura no local da produção pelo período do contrato. Hipoteticamente, poderiam ser fixados valores de K de forma que se as temperaturas excederem a média ideal para a produção, o produtor tenha direito à indenização. Da mesma forma, se as temperaturas se mantiverem dentro dos limites esperados, o agricultor teria um payoff negativo com o contrato.
Para resguardar ambas as partes contra eventos climáticos extremos, poderiam ser incorporados limites máximos e mínimos de payoff. Destarte, em caso de eventos climáticos extremos os prejuízos das partes podem ser fixados a valores limites compatíveis com a perda da produção.
Opções Climáticas
Assim como ocorre com outros tipos de derivativos, também são negociadas opções de compra (calls) e venda (puts) nos mercados. Em geral, o direito só pode ser exercido no vencimento do contrato. Os mecanismos de indenização são estruturados de maneira similar aos próprios contratos futuros e a termo, ou seja, de acordo com a equação 1. Assim, existe payoff para opções de compra quando o valor do índice climático (x) excede o valor esperado do strike (K). De maneira análoga, existe payoff para opções de venda quando o resultado do índice climático é abaixo do strike. Destarte, o valor final do ganho ou perda do contrato é o resultado do payoff menos o valor do prêmio pago na contratação.
Assim como nos contratos de futuro climático, a negociação de opções pode incluir limites de payoff. A diferença é apenas que estes limites atuam somente sobre um dos lados: em caso de call são utilizados limites máximos, em caso de put são utilizados limites mínimos, de forma que o payoff mínimo em ambas as situações é 0 e o prejuízo máximo equivale ao prêmio pago.
Por exemplo, considerando um agricultor que cultiva uma plantação sensível à quantidade de chuva, como milho, em uma região onde a média histórica de precipitação mensal é de 50 mm. Ante a possibilidade de uma temporada de chuvas abaixo ou acima da média, o agricultor pode firmar contratos de opção que estabelecem limites máximos e mínimos de chuvas abaixo do qual ele será indenizado. Para as opções de call, serão indenizados os meses em que a pluviosidade for menor que 40 mm, protegendo sua receita contra a seca e garantindo um fluxo de caixa mínimo para sua operação. Por outro lado, para as opções de put, a situação se inverte: ele seria indenizado nos meses em que a pluviosidade ultrapassasse um certo limite, digamos, 70 mm, protegendo-o contra excesso de chuva que possa prejudicar suas plantações.
Considerações Finais
Os crescentes impactos das mudanças climáticas sobre as regiões agrícolas introduzem novos desafios para os produtores. Diante desse cenário, a adoção de derivativos climáticos emerge como uma ferramenta crucial na gestão dos riscos decorrentes dessas mudanças no agronegócio.
A possibilidade de estruturar contratos vinculados a diversas variáveis climáticas e a flexibilidade na configuração dos pagamentos possibilitam uma adaptação dos contratos às necessidades específicas de diferentes agentes e setores. Incentivando os órgãos públicos a investirem em métodos de previsão mais precisos, visto que sua negociação nos mercados financeiros pode ampliar a eficiência da gestão governamental na política agrícola.
Bem como, o uso dos derivativos climáticos abrem novas oportunidades para a gestão de riscos, podendo substituir os seguros agrícolas tradicionais por opções vinculadas a índices climáticos ou aos próprios contratos de derivativos climáticos. Proporcionando uma maior clareza aos produtores, já que reduz o risco de estimativas imprecisas de perdas por ser um método transparente de avaliação de desempenho do valor a ser pago ou recebido no final da operação, tanto para os produtores quanto para as seguradoras.
No entanto, o desenho de contratos climáticos no Brasil enfrenta desafios, como a obtenção de dados climáticos para a precificação correta com o aumento de estações meteorológicas, o conhecimento da modalidade contratual pelas partes relacionadas ao agronegócio, e a correlação correta no contrato entre o índice meteorológico e a produtividade agrícola ao longo das safras.
13/05/24
Maria Clara dos Anjos