A Lei nº 13.467/17, conhecida como “Reforma Trabalhista”, inseriu no ordenamento jurídico a possibilidade da substituição do depósito recursal por fiança bancária ou seguro garantia judicial, ou seja, sobrevindo a hipótese da empresa apresentar recurso em sede de ação trabalhista, ao invés de desembolsar uma quantia mais onerosa a título de garantia do débito (depósito recursal), pode optar por uma via de menor impacto financeiro, sem que comprometa seu fluxo de caixa e/ou cerceie seu direito ao contraditório, ampla defesa e duplo grau de jurisdição.
Para uma compreensão do quadro, cumpre-nos expor, incialmente, que o depósito recursal trabalhista é depositado – em conta vinculada do juízo - por pessoas jurídicas condenadas em processos judiciais, as quais, porém, desejam interpor recurso para reverter a condenação. Trata-se de um requisito indispensável do apelo recursal, sem o qual o recurso, nas espécies em que exigidos, não é conhecido, pois o intuito do legislador foi o de garantir que a empresa será capaz de pagar o valor referente a condenação, caso ela se confirme nos tribunais.
Nesse aspecto, a legislação prevê que o valor do depósito recursal – no recurso ordinário - será equivalente ao valor da condenação, ou seja, aquele constante à Sentença condenatória; conquanto limitado ao valor de R$12.665,14 (doze mil, seiscentos e sessenta e cinco reais e quatorze centavos) para o ano de 2024, cujo teto é reajustado anualmente pelo Tribunal Superior do Trabalho.
Além do recurso acima mencionado, outros recursos trabalhistas igualmente exigem o prévio depósito recursal como pressuposto de admissibilidade, os quais, exemplificativamente, citamos, o Recurso de Revista, Embargos e Recurso em Ação Rescisória, cada qual com valor de R$ 25.330,28 (vinte e cinco mil, trezentos e trinta reais e vinte e oito centavos), para o ano de 2024.
Dado o ônus acima, já previsto nas regras da CLT desde o início de sua vigência, é que a Lei nº 13.467/17 trouxe nova redação ao art. 899; diminuindo o impacto financeiro a ser suportado pelas empresas com o ônus da garantia judicial ao interpor recursos em face de decisões condenatórias:
Com isso, em vez de fazer o pagamento do depósito recursal em dinheiro, a parte interessada pode apresentar um seguro depósito recursal. Ele é uma modalidade de seguro garantia utilizado por aqueles que precisam fazer um depósito recursal e não podem dispor da totalidade da quantia em dinheiro.
Salientamos que, se de um lado, o depósito recursal é equivalente ao valor da condenação, limitado ao valor de R$12.665,14 (doze mil, seiscentos e sessenta e cinco reais e quatorze centavos) para os casos em que a Sentença condenatória for superior a esse montante, o valor para contratação de um seguro garantia judicial gira em média de 0,8% (oito décimos por cento) a 2,0% (dois por cento) ao ano, calculado sobre o valor a ser garantido, cuja cotação dependerá dos riscos judiciais, período de cobertura e dos índices cobrados pela Seguradora contratada.
Portanto, em regra, o seguro garantia é considerado a melhor opção, já que é economicamente mais vantajoso se comparado com outras modalidades de garantias aceitas pelo Poder Judiciário.
Com essa ferramenta, a empresa que pretende buscar a rediscussão da matéria perante os Tribunais tem o seu direito ao contraditório e a ampla defesa preservado, sem que isto lhe custe relevantes impactos de caixa, o que, por vezes, poderia lhe obstaculizar o acesso a justiça; conquanto, de outro lado, assegura-se ao Reclamante/Empregado a certeza do pagamento do débito caso a decisão que lhe seja favorável seja mantida.
Não obstante a vantagem financeira do seguro garantia em substituição ao depósito recursal para as empresas, há de se salientar a minuciosidade na prática do ato, visto que ainda se trata de matéria sensível perante os Tribunais, inclusive com entendimentos divergentes na aferição da regularidade da apresentação da documentação necessária para se atingir o escopo do instituto processual. Consequência da ausência de apresentação dos documentos exigidos no mesmo prazo da espécie recursal é a decretação de deserção do apelo, impedindo o prosseguimento do feito e mantendo a decisão da qual se pretendia recorrer em desfavor da empresa recorrente.
Por fim, trazemos a título de informação outra questão ainda divergente nos Tribunais, inclusive no Tribunal Superior do Trabalho, consistente na exigibilidade do seguro garantia abranger um acréscimo de 30% (trinta por cento) sobre o valor da condenação. Referida questão decorre do fato de que assim é exigido pelo Código de Processo Civil - CPC, porém sem previsão expressa na CLT.
Nesse sentido, em 2019, o Tribunal Superior do Trabalho publicou o Ato Conjunto TST.CSJT.CGJT 1, DE 16 DE OUTUBRO DE 2019, que dispõe acerca do uso do seguro garantia judicial e da fiança bancária em substituição ao depósito recursal para fins de garantia da execução trabalhista.
O referido Ato Conjunto trouxe uma série de requisitos a serem cumpridos para a utilização para a substituição do depósito recursal pelo seguro, dentre elas o acréscimo de no mínimo 30%:
A despeito da discussão acerca da legalidade para se exigir – na legislação específica (CLT) - o acréscimo de 30% ao seguro garantia de depósito recursal, visto que inexiste reserva legal para tanto, fato é que a matéria ainda segue divergente nos Tribunais, mesmo perante o Tribunal Superior do Trabalho.
Confira-se, na contramão do provimento acima transcrito, entendimento minoritário da Corte Superior do Trabalho:
SUBSTITUIÇÃO POR SEGURO GARANTIA JUDICIAL. REGRA ESPECÍFICA DO ART. 899, §§ 4º E 11 DA CLT. INAPLICABILIDADE DA OJ 59 DA SBDI-2 E DO ART. 835, § 2º DO CPC. No caso discute-se a regularidade do depósito recursal realizado por meio de seguro garantia judicial. O Tribunal Regional decidiu que a utilização do seguro garantia judicial para substituição do depósito recursal exige o cumprimento do art. 835, § 2º, do CPC, ou seja, deve-se recolher o valor integral arbitrado à condenação acrescido de 30%. A causa apresenta transcendência jurídica, nos termos art. 896-A, § 1º, IV, da CLT, uma vez que a matéria, regulamentada pela lei 13.467/17 ainda não foi analisada pelo Tribunal Superior do Trabalho. Nos termos do art. 899, §§ 4º e 11 da CLT, o depósito recursal, em valor estipulado em ato do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, pode ser realizado em conta vinculada ao juízo, corrigido com os mesmos índices da poupança e pode ser substituído por fiança bancária ou seguro garantia judicial. Constatado que a parte apresentou seguro garantia judicial no valor máximo do depósito recursal para o recurso ordinário, cuja apólice prevê a correção do valor pelos índices da poupança, foi atendido o art. 899, §§ 4º e 11 da CLT. O art. 835, § 2º, do CPC e a OJ 59 da SBDI-2 dizem respeito à garantia da execução e não são aplicáveis ao depósito recursal que possui regência expressa em outros dispositivos legais. Dessa forma, a exigência do valor total arbitrado à condenação acrescido de 30% para fins de depósito recursal viola o art. 5º, LV, da CF. Deserção afastada. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. PROCESSO TST- RR-10152-53.2018.5.03.0007-Relatora: CILENE FERREIRA AMARO SANTOS- Publicação: 5/6/19.
SUBSTITUIÇÃO DO DEPÓSITO RECURSAL PELO SEGURO GARANTIA JUDICIAL. INEXIGÊNCIA DO ACRÉSCIMO DE 30% DO VALOR. Nos termos do § 11 do art. 899 da CLT, introduzido pela lei 13.467/17, "O depósito recursal poderá ser substituído por fiança bancária ou seguro garantia judicial". Logo, verifica-se que o referido dispositivo legal, ao prever a possibilidade de substituição do depósito recursal pelo seguro garantia judicial, não estabeleceu nenhuma exigência de acréscimo do valor, razão pela qual não cabe ao intérprete fazê-lo. Desse modo, não há falar em deserção, porque, na substituição do depósito recursal pelo seguro garantia judicial, não se exige o acréscimo de 30% sobre o valor daquele. Assim, superado o óbice imposto na decisão de admissibilidade e estando atendidos os pressupostos extrínsecos do recurso de revista remanescentes, prossegue-se na análise dos pressupostos intrínsecos dele, nos termos da OJ 282 da SDI-1 deste TST. PROCESSO TST-AIRR-1001307-25.2017.5.02.0315 - Relatora: Ministra Dora Maria da Costa-Publicação: 25/10/19.
Diante do exposto, a empresa que pretende apresentar recurso, valendo-se do seguro garantia em substituição ao depósito recursal, tem, de um lado, o bônus de se tratar de uma via financeiramente menos onerosa; conquanto, de outro lado, deve estar atenta a documentação exigida pelo juízo competente na interposição de seu apelo, tais como certidão de regularidade da sociedade seguradora junto à SUSEP e da comprovação de registro da apólice na SUSEP, a fim de evitar eventual deserção do apelo recursal. Ainda, necessário um estudo prévio acerca do acréscimo de 30% (trinta) por cento sobre o valor da condenação, a fim de assumir – cientemente – os riscos inerentes a instabilidade jurisprudencial da matéria.
Allan Modesto
20/05/2024