Sendo o contrato uma ferramenta que visaregulamentar o acordo ou convenção, em suas diversas formas, entre pessoas, como escopo de estabelecer ou regulamentar a execução de avenças sob determinadascondições, deve obedecer a determinados regramentos previstos em lei, sejam deordem geral ou específicos.
Nesse aspecto, o Código Civil, como fontelegislativa geral, regulamenta a matéria sob diversos vieses, trazendo,sobretudo, requisitos mínimos de validade, como agente capaz, objeto lícito,possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.
Conquanto, tratando-se de contratos agrários, a norma geral é complementadae/ou derrogada pela legislação específica, a começar pela própria ConstituiçãoFederal, que em seu art. 186 dispôs que a função social da propriedade ruralserá cumprida quando se observar os requisitos do aproveitamento racional eadequado; utilização adequada dos recursos naturaisdisponíveis e preservação do meio ambiente; observânciadas disposições que regulam as relações de trabalho; e aexploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Indo além das premissas constitucionais e principiológicas doordenamento jurídico, no caso dos contratos agrários a legislaçãoinfraconstitucional cuidou de condições mínimas e obrigatórias a constar nessesnegócios jurídicos, dando contornos específicos ao setor, conforme o Estatutoda Terra, Lei nº 4.504/64, e o Decreto-lei nº 59.566/66.
Nesse sentido, o art. 3º do Decreto nº 59.566/66, conceituando o Contrato de Arrendamento Rural como contrato agráriopelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, ouso e gozo de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, outrosbens, benfeitorias e ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercidaatividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa ou mista,mediante, certa retribuição ou aluguel, observados os limites percentuais daLei, expressamente faz alusão as condições obrigatórias de fixação do prazo, da designação do imóvel, dosdesdobramentos de eventuais benfeitorias realizadas e/ou o uso e gozo daquelesjá existentes e a retribuição financeira – fixada em dinheiro – a ser paga peloArrendatário.
Uma observação importante é com relação à forma depagamento, que pode ser feita em dinheiro ou até mesmo em produto, neste casodesde que equivalente a quantia de dinheiro certa e previamente determinada;sendo justamente umas das condições que distingue o contrato de arrendamento daparceria rural.
Isso porque, de outro lado, o contrato de parceriarural, regulamentado pelo art. 96, V, do Estatuto da Terra, é aquele que e fixa as quotas-limites de repartição dos frutos daexploração agrícola e os riscos do empreendimento, conforme o art 4º do Decreto56.566/66.
Nesse ínterim, a parceria rural é o contrato agrário pelo qual umapessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o usoespecífico de imóvel rural, de partes do mesmo, incluído ou não benfeitorias,outros bens e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade deexploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal ou mista; e/oulhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração dematérias primas de origem animal, mediante partilha de riscos de caso fortuitoe da força maior do empreendimento rural, e dos frutos, produtos ou lucroshavidos nas proporções que estipularem, observados os limites percentuais dalei.
No que tange ao requisito de “tempo determinado ou não”, lembramosque o contrato de parceria rural expressamente prevê o prazo de no mínimo 3(três) anos para sua vigência na hipótese de não ter sido previamenteestipulado prazo inferior, já demonstrando a necessidade dos contratantes deobservar referida condição desde o início das tratativas.
Outra cláusula obrigatória a ser observada na parceria agrícola,pecuária, agroindustrial e extrativa é a quota-limite do proprietário naparticipação dos frutos, segundo a natureza de atividade agropecuária efacilidades oferecidas ao parceiro. Na participação dos frutos da parceria, aquota do proprietário não poderá ser superior a 20% (vinte por cento), quandoconcorrer apenas com a terra nua; 25%(vinte e cinco por cento), quandoconcorrer com a terra preparada; 30% (trinta por cento), quando concorrer com aterra preparada e moradia; 40% (quarenta por cento), caso concorra com oconjunto básico de benfeitorias, constituído especialmente de casa de moradia,galpões, banheiro para gado, cercas, valas ou currais, conforme o caso; 50%(cinquentapor cento), caso concorra com a terra preparada e o conjunto básico debenfeitorias enumeradas na alínea d deste inciso e mais o fornecimento demáquinas e implementos agrícolas, para atender aos tratos culturais, bem comoas sementes e animais de tração, e, no caso de parceria pecuária, com animaisde cria em proporção superior a 50% (cinquenta por cento) do número total decabeças objeto de parceria; 75% (setenta e cinco por cento), nas zonas depecuária ultraextensiva em que forem os animais de cria em proporção superior a25% (vinte e cinco por cento) do rebanho e onde se adotarem a meação do leite ea comissão mínima de 5% (cinco por cento) por animal vendido.
Além disso, temos, também, como condições de fixação obrigatórias naparceria as bases para as renovações convencionadas; formas de extinção ourescisão; direitos e obrigações quanto às indenizações por benfeitoriaslevantadas com consentimento do proprietário e aos danos substanciais causadospelo parceiro, por práticas predatórias na área de exploração ou nasbenfeitorias, nos equipamentos, ferramentas e implementos agrícolas a elecedidos; e o direito e oportunidade de dispor sobre os frutos repartidos.
A partir disso, observa-se que a legislação constitucional einfraconstitucional trouxe condições indispensáveis a serem observada pelaspartes na formalização dos contratos agrários, principalmente àquelesnominados/típicos, distinguindo uns dos outros e combatendo eventuais nulidadese/ou abusos econômicos dos agentes envolvidos; além de preservar a própriafunção social do imóvel rural no Estado social brasileiro.
Portanto, não só para evitar nulidades, em razão de eventual inobservânciada legislação em vigor, mas para preservar a inteireza e a real manifestação devontade das partes ao firmar o negócio jurídico, é que o contrato agrário deveráser pormenorizadamente elaborado e avaliado pelas partes, atingindo suafinalidade social e mantendo a integridade da cadeia agroindustrial.
Allan Modesto
26/04/2023